terça-feira, 30 de março de 2010

O extracotidiano

Passos pela calçada.Uns mais rápidos, outros nem tanto.Uma velhinha de coluna meio torta carrega uma bengala que nem toca o chão.Outro, agachado, procura moedas caídas no calçadão.A criança segura a mão de outra criança - esta, grande - e leva seu dedo até a boca mantendo fixo o olhar na propaganda de sorvetes.

De repente eu me surpreendo: tem um cara sentado na calçada.Ele olha o nada.Ele olha o nada? Será que pensa no tempo que o tempo levou, na vida que nunca mais é, ou foi, ou nem sei mais onde está o aqui.As barreiras entre o cotidiano e sua dilatação, entre o que é comum e o que é não, diluem-se em vão: é meu olhar iluminando o corriqueiro e transformando-o em surpresa.

Acordem ! Acordem o olhar pra beleza da feiúra e para a feiúra da beleza !

quinta-feira, 25 de março de 2010

Peter Brook


"No período de ensaios é preciso cuidado para não avançar demais antes do tempo.Muitas vezes, atores que se exibem emocionalmente logo no começo, perdem a capacidade de descobrir relações autênticas entre si. (...) No entanto, quando os atores estão acostumados a começar amontoados em torno de uma mesa, protegidos por cachecóis e xícaras de café, é essencial, pelo contrário, liberar a criatividade corporal através do movimento e da improvisação (...).Como se consegue fazer para que essa expressão íntima cresça até preencher um amplo espaço, sem traição? Como se eleva o tom de voz sem distorcer a relação? É extremamente difícil: eis ai o paradoxo da interpretação".



"Não se deve tomar tudo o que está no livro como dogma, nem como classificação definitiva, tudo está sujeito ao acaso e a mudança".

Peter Brook

O consagrado diretor inglês, conhecido principalmente por montagens de peças de Shakespeare é autor de alguns livros nos quais esboça possíveis caminhos, tenta iluminar um pouco as investigações daqueles que aceitarem o convite.Mas o caminho é o passo.Ser e estar numa espécie de "presente-gerúndio".

Hamlet continua a ler: palavras, palavras, palavras, palavras.Aqui jaz um dos paradoxos do trabalho historiográfico: constelar a vida - tempo - em letra.Penso que um bom teórico da arte - e a arte pode dispensar a teoria quando julgar necessário - deve transformar sua tese em poesia: tecer o indizível em palavras.

Jeferson Torres

quarta-feira, 24 de março de 2010

Grotowski: sobre o cigarro

Quando vejo os atores que possuem uma respiração orgânica por causa dos impulsos orgânicos, vivos na ação, ainda que fumem muito, observo que não tem nenhum problema vocal.Eu também fumo e não tenho nenhum problema. (...).Na verdade muitos atores deveriam limitar o número de cigarros antes do espetáculo, mas se a tentação for muito forte (...) antes de entrar em cena fumem um cigarro; não criem ansiedade.É sobretudo uma questão de bom senso (...).Não exagerem naquilo que chamam de "treinamento da força de vontade"etc.O desenvolvimento de si não chega por meio de uma atitude rígida, como a morte, que envolve a totalidade da vida, uma atitude que concentra todos os nossos esforços sobre um único ponto (GROTOWSKI in FLASZEN & POLLASTRELLI, 2001,p.145).
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FLASZEN,Ludwik & POLLASTRELLI,Carla.O teatro laboratório de Jerzy Grotowski 1959-1969.São Paulo:Perspectiva:SESC:Pontedera,IT:Fundazione Pontedera Teatro,2007.Trad.Berenice Raulino.

Boas fumaças a todos.

segunda-feira, 22 de março de 2010

Palavras sobre o "treinamento" atoral

Eu estou em treinamento ...

... quando eu abro os olhos.Quando eu respiro.Quando eu piso no chão.Quando eu olho pro céu.Quando eu me dou conta da presença do outro.Quando eu me percebo no outro.Quando eu me fecho.Quando me calo.Quando eu grito.Quando eu transo.Quando eu realmente transo, num sentido mais demodé, quiça: entrego-me e recebo, compartilho.Quando eu danço.Quando eu canto.Quando eu corro.Quando eu paro.Quando eu deixo que a monotonia do dia revele aquilo que de inusitado, extracotidiano, reside em minha cegueira.Quando eu abraço.Quando eu desfaço.Quando eu caio.Quando me levanto.Quando respiro.Quando me sei vivo no ato de respirar.Quando eu me permito e permito ao outro.Quando eu me sei fraco.Quando eu gozo, mesmo na derrota.Quando eu gozo da derrota e me faço vitória por saber-me vencido.Quando eu fecho os olhos.Quando sonho.Quando vôo com os pés no chão.Quando eu me sei criança, ainda que adulto, e brinco sem vergonha.

Eu estou em treinamento, enfim, quando não estou ausente de mim.

Treinamento = processo educacional.
Processo educacional = vida.

sábado, 20 de março de 2010

Helena dos sonhos

Dessa vez Everton Bonfim é apenas ator e também responsável pela adaptação do texto do uruguaio Eduardo Galeano para o teatro - apenas sem nenhuma denotação depreciativa, sê-lo não é nem de longe ser "apenas".Trata-se de uma criação coletiva, direção, figurino, iluminação e sonoplastia - constituída por por músicas tocadas ao vivo pelos próprios atores - foram construídas pelo grupo que participou do curso livre de teatro promovido pelo grupo Teatro de Garagem.

A peça trata do universo onírico enquanto metáfora da vida real.Helena, personagem de Ana Alice Cafolla, sonha em sua cama solitária e quando acorda não sabe se sonho ou realidade o que está vivendo.Entre sonhos bobos, eróticos,sombrios, cômicos e pesadelos, ela constrói seu próprio mundo real e simbólico, cotidiano e extracotidiano ao mesmo tempo.

Quanto aos atores, nota-se uma certa disparidade no que tange à qualidade da atuação, o que leva a um desequilíbrio no desenrolar das cenas, mas levemos em conta a presença de atores que estão tendo nessa a sua primeira experiência com o teatro.
Fica àquele que se interessarem em experimentar esse sonho:

Helena dos Sonhos
Criação coletiva do Teatro de Garagem
Quando? 21 de março, às 21h
Onde? Na Vila Cultural Cemitério dos Automóveis, rua João Pessoa (cruza com a Quintino Bocaiúva) nº103 A
Quanto ? R$ 5,00

Mas se você não puder assistir amanhã fique ligado, eles prometem apresentar novamente muito em breve.

sexta-feira, 19 de março de 2010

Abis/OM é premiado em Manaus

Como disponível em http://daianebaumgartner.blogspot.com/2010/03/abisom-e-premiado-em-manaus.html (19/3/2010)

O espetáculo "Abis/OM", solo do ator Gerrah Tenfuss, foi um dos premiados no Festival Breves Cenas de Teatro, que aconteceu entre os dias 13 e 15 de março de 2010 no teatro Municipal de Manaus. O Festival recebeu cenas de todo o Brasil e teve como jurados: Helder Vasconcellos, músico, ator e bailarino, um dos criadores do "Mestre Ambrósio" com o qual viajou a diversos países; Sandra Corveloni, atriz formada pela PUC-SP, que, além de vários outros trabalhos ao longo de sua carreira, esteve no premiado filme "Linha de Passe" de Walter Salles e Daniella Tomas, onde recebeu a Palma de Ouro de Melhor Atriz no Festival de Cannes 2008; e Leonardo Lessa, ator licenciado em teatro pelo Curso de Artes Cênicas da UFMG, e desde 2008 Coordenador Geral do Galpão Cine Horto, centro cultural do grupo Galpão em Belo Horizonte.
Os jurados concederam o "Prêmio Américo Alvarez de Breve Cena" para as quatro melhores cenas que aconteceram dentro do formato de Breve Cena. Além de "Abis/OM", foram premiadas também:"O Quarto" de Viviane Palandi - SP; "Recriando Mitos Tikuna" da Cia. Teatral A Rã Qi Ri - AM; e "Que é Isso, Maria?" do Grupo IFCE- CE
O prêmio principal, que é o direito de se apresentar no Festival Cenas Curtas que é realizado em Belo Horizonte pelo Galpão Cine Horto, foi dado a "O Funeral" da Cia. Buffa de Teatro - BA.
A próxima parada de "Abis/OM" é o FIT - Festival Ipitanga de Teatro, que irá acontecer em Lauro de Freitas na Bahia ainda sem data definida.

Yoshi Oida de presente pra vocês

Yoshi Oida é aquilo que seu mais conhecido livro sugere em seu título: um ator errante.Depois de iniciar sua trajetória artística no Japão Oida migrou para a França onde passou a atuar junto ao diretor inglês Peter Brook, participando de montagens de diversas peças e também em filmes, como na versão cinematográfica do Mahabarata e em Livro de Cabeceira, de Peter Greenway.A biografia de Oida constitui exemplo de investigação pessoal através da troca com o outro, ele é meio que como um "ator cigano" que tornou-se ponto de encontro entre o oriente e o ocidente reafirmando assim uma tendência muito particular no século XX, que remonta aos encontros entre Mei Lang Fang e Meyerhold, Kazuo Ohno e Mary Wigman, bem como às pesquisas da antropologia teatral.

Encontrei uma série de três vídeos gravados em um workshop de Oida e decidi fazer como ele, compartilhar.Afinal de contas, do que é feito o teatro senão de um compartilhar ? (risos).Faltam as legendas - como de costume - mas ainda assim vale a pena assistir, é material valioso, ainda bem que existe youtube nessas horas.

Parte 1 (para as outras duas recorra ao youtube através do link do título do post):

Tou Teatro

Tou teatro é um espaço aberto a todas as linguagens.
o tou neste ano completa 10 anos e estará abrindo as portas para todos os artistas que estiverem dispostos a desenvolver seus trabalhos como: pesquisas, oficinas, apresentações, exposições, projeções, instalações, etc etc etc.
qualquer trabalho de natureza artistica.
O tou esta aberto para a ocupação integral da casa.

Para receber mais informações sobre a ocupação do espaço enviar um e-mail para: touteatro@hotmail.com
com o "assunto" ocupação.

O tou fica na rua rio grande do sul, no. 75. Se ainda não conhece, faça uma visita.

quarta-feira, 17 de março de 2010

Ói nóis aqui traveiz: crítica e uma breve entrevista


Em meio ao zum zum zum cotidiano da praça uma música vai ganhando força ao fundo.Somos saudados – e saudamos – a chegada de personagens do camdomblé que nos apresentam Marighela como Exu, orixá conhecido pelo seu espírito guerreiro.A abertura da roda dá espaço à capoeira.Somos então surpreendidos por mestre Pastinha e mestre Bimba, amigos de Marighela.O primeiro é conhecido por ter levado a capoeira D’Angola, de gênese africana, de volta a seu continente de origem.O segundo foi, como seu amigo Carlos, um revolucionário, na medida em que modernizou a capoeira inserindo elementos do caratê e demais artes marciais criando assim a chamada “capoeira regional”.Marighela é assim reafirmado como guerreiro nacional através da associação estabelecida com a dança marcial afro-brasileira.
E de novo lá vem Marighela, dessa vez de encontro a Virgulino, que pede espaço ao público para saudar seu parceiro trazendo consigo o violão e tendo um pandeirista a acompanhá-lo: é a vez do repente entrar, de repente, na história.Até Lenin e Stalin invadem a cena, o que pode ter causado estranhamento aos que ignoram as possiveis associações entre o pensamento político dos revolucionários russos e aquele do personagem central da trama.Até então, o que temos é um festival de citações imagético-sonoras que traz à roda os já citados numa celebração da alegria do povo brasileiro.
No entanto, como de costume, sempre aparece alguém pra acabar com a festa, e nesse caso é o golpe de estado que desempenha tal papel.Representado por um tanque de guerra preto que quase atropela os espectadores invadindo a cena, a ruptura com o tom festivo que até então pairava na praça é reforçada por uma gravação do pronunciamento do AI-5 emitida em um volume ensurdecedor pelo veículo dirigido por atores fantasiados de pássaros negros.
A partir dai não mais repente, não mais capoeira, não mais candomblé, não mais festejar.A encenação entra em um momento de tensão que manifesta-se pelo silêncio.É esse silêncio que, ao quebrar com a até então alegre musicalidade da peça, re-apresenta o estado de exceção que constituiu a ditadura brasileira.Os atores são arrastados junto ao público para um outro local da praça no qual uma atriz faz-se de criança empunhando um balão de gás hélio – propositalmente vermelho? – que é estourado pela tirania de um general militar.A imagem é óbvia: a inocência infantil sacrificada pelo algoz.Talvez fizessem melhor em amenizar tal obviedade que acaba por conceder ao todo um caráter meio apelativo.
A representação finda-se em meio a uma chuva de papeis que trazem em si grafados nomes de revoltosos mortos pelo regime militar.A menina que em cena anterior descrita no parágrafo precedente tivera seu lindo balãozinho estourado é enfim liberta e, por sua vez, liberta os balões que agora traz consigo.Como sementes de libertação os aeróstatos espalham-se pelo céu londrinense: a liberdade ganhou, e sua vitória é vitória não só de Marighela, mas de tantos outros anônimos que ao lado dele lutaram pela liberdade do povo brasileiro
Minha avaliação final é positiva. O grupo de teatro de rua “Ói nóis aqui traveiz” transformou o calçadão da cidade de Londrina em um palco aberto à celebração da diversidade cultural brasileira numa pintura carnavalesca de um personagem importante da nossa recente história. A moldura construida pela “tribo de atuadores” – como se autodenominam – desafia o ar rabungento comum às fotografias da época em busca de um quadro muticolorido, que contrasta com a imagem de Carlos como pregada pela ditadura e celebra o pluriculturalismo do povo brasileiro.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Entrevista com Franco Ruffini



A princípio Franco Ruffini dispensa comentários.Ainda assim, considerando a ignorância senso-comunal que paira em nosso meio (1), cabe uma breve introdução:

Franco Ruffini é um importante pesquisador teatral italiano que atua ao lado de Eugenio Barba junto à ISTA (International School of Theatre Antropology) (2).Nessa entrevista ele remonta à época em que foi convidado a participar do projeto de Barba e reflete sobre seu trabalho junto a escola internacional de antropologia teatral.Trata-se de uma entrevista que vale a pena ser assistida por todos aqueles que se interessam seja por teatro, por antropologia, por filosofia ou qualquer área do conhecimento humano que de alguma forma enriqueça os estudos sobre o comportamento humano em uma situação extra-cotidiana.

Peço-te para que tome essa minha atitude como um convite à partilha.Caso encontre algo de interessante sobre o assunto, sugira-me, poste na internet, compartilhe com aqueles que também se interessam pelo tema.



(1) Quero salientar que não vejo essa ignorância com depreciação preconceituosa, como uma espécie de ogeriza a uma "burrice" coletiva.Não confundamos as coisas.Critico sim, o desinteresse ao estudo teórico do trabalho do ator, mas ao mesmo tempo respeito aqueles que não se interessam por esse plano de análise pura e simplesmente por defender o direito que cada um tem de se interessar pelo que lhe convier.

Prefiro encarar esse post, e o projeto do blog no qual ele está contido como um convite à discussão sobre a arte de ator, um "bate papo" entre aqueles que, como eu, sabem-se ignorantes, e justamente por saber-se, investigam.Que a teoria sirva de luz, uma luz que ilumine nossa ignorância revelando nesta a sua riqueza, riqueza esta que reside num estado de insatisfação com a mesma.

O motor do conhecimento - que confunde-se à ignorância admitida ou pressentida - é a curiosidade.Não deixemos de ser ignorantes curiosos.

domingo, 14 de março de 2010

Entrevista com Marlon Brando (sem legendas)



EM INGLÊS, SEM LEGENDAS.

Grande ator.Grande ator? Não.É que existe um solo sobre o qual "germinando é" um artista.Falo de vida: Brando foi um cara de personalidade.Ele não interpretava personagens, ele vivia situações.E não me venham falar de "psicologismos" strasberguianos, porque esse cara nunca caiu nessa.Brando deixou-se orientar acima de tudo por si mesmo, reconheceu em Stella Adler uma instigadora.
Stella Adler, sim, aquela que depois de tomar contato com Stanislavski voltou pros Estados Unidos e rompeu com Strasberg.

Aos aficcionados por cinema, pelo trabalho do ator no cinema, ou simplesmente pretendentes a ouvir declarações sinceras de um artista consagrado, fica a dica.

O problema é que a entrevista está em inglês e sem legendas.Bom, quem puder assistir assista.Vale a pena.

sábado, 13 de março de 2010

O amargo santo da purificação



O grupo "Ói nóis aqui travéiz", já sagrado no cenário teatral brasileiro por seu sólido trabalho traz à Londrina um espetáculo que trata da biografia do revolucionário brasileiro Carlos Marighella (1911 - 1969).A experiência reforça o caráter estética e politicamente engajado do grupo que se utilizou de textos de Marighela musicados por Johann Alex de Souza e que constituem importante fio na tessitura do texto espetacular desenvolvido para apresentação na rua.

Serviço:

O amargo santo da purificação: uma visão alegórica e barroca da vida, paixão e morte do Revolucionário Carlos Marighella.
Dia 16 de março, terça-feira, ás 16:00h no calçadão de Londrina*.


*Em caso de chuva a apresentação será transferida para o dia 17 no mesmo local e horário.

O grupo tem o apoio da PETROBRÁS e pode ser trazido para Londrina com o apoio da secretaria municipal da cultura, da Escola Municipal de Teatro e da FUNCART.

quinta-feira, 11 de março de 2010

Ler a história

A história do teatro no nosso século não se limita à história dos espetáculos. Basta apenas confrontar o conteúdo de qualquer livro de história com o que é encontrado nas crônicas da época para verificar como grande parte do iceberg do teatro está sob a historiografia.

Fabrizio Cruciani

O estudo da história do teatro pode nos servir de antídoto contra a falsa designação de "original" àquilo que, de fato, constitui reprise.Como ressalta Cruciani na epígrafe deste texto, há muito o que "garimpar" do patrimônio histórico teatral.O trabalho do historiador não deixa de ser, metaforicamente falando, o de um garimpeiro, ele caça o ouro oculto pelo esquecimento .
Ao ler as páginas e mais páginas de história do teatro, mergulhemos em sua concretude como quem se submete a um trabalho de parto: ouçamos as vozes dos nossos antepassados e descubramos o quanto de nossa voz faz ecoar seus questionamentos.

Como convite a essa audição, apresento-lhes o mestrado de meu mestre, Camilo Scandolara.Nele o pedagogo disserta sobre a importância dos estúdios do teatro de arte de Moscou na formação do pensamento pedagógico teatral no século XX.

O trabalho pode ser obtido em http://libdigi.unicamp.br/document/?code=vtls000410155

Obs.: É necessário registrar-se no site para obter acesso ao download da obra (em PDF).

domingo, 7 de março de 2010

Um convite à leitura

Fechar-se em um determinado tipo de leitura é postura muito comum.Alguns não dispensam um bom romance, outros, não largam daquele filósofo favorito, e outros, ainda - creio eu, a maioria -, preferem assistir tv ou passear pelo youtube."Pra que prender os olhos às páginas se o espetáculo na tela mais me atrai ?"- perguntam-se.

Respeito essa atitude.Eu mesmo sou um curioso navegador do universo virtual.Agora mesmo, lendo essas palavras, você está provavelmente sentado na frente de uma tela de computador e pode informar-se do conteúdo deste texto que com tanto carinho redigi para meus leitores.Viva a internet ! Ela está ai para ser usada, para que nos aproveitemos dela mesmo, divulguemos nossas ideias, ela é afirmação da "condição pós-moderna", e de pouco adiantaria tecer críticas irredutíveis sobre a chamada "condição pós-moderna" sem considerar seus imponderáveis benefícios dentre os quais a internet é talvez o mais evidente.

A internet é uma ferramenta, um meio, a maneira com a qual a usamos é outra história: ai é que está o grande questão.

Deixando tal questão no âmbito das inquietações que futuramente poderão manifestar-se em textos confeccionados para esse blog, parto enfim para a afirmação de seu objetivo: venho convidá-los a conhecer um livro.

Ah... Chato ? Alguns poderiam dizer que sim.Mas o que é um livro senão um convite ? Só venho com este chamar sua atenção para a existência desse convite que eu aceitei e tanto me aprouve.Se ele lhe será instigante ou não é coisa que só descobrirá se, como eu, abrirem esse convite e navegarem por suas páginas.

Falo de "A condição pós-moderna".A obra é de autoria do filósofo francês Jean Françoise que traça as características gerais daquela que configura-se como condição pós-moderna: condição, e não época. Como escreve o filósofo Paulo Ghiraldelli Jr., sobre esse assunto:

"Há a "condição pós-moderna", não a "época pós-moderna", em um sentido mais rigoroso.É claro que nem todos podem se reconhecer sob a condição pós-moderna".

Aliás foi por percebê-lo que o pessoal da editora José Olympio mudou o nome do livro.Nas primeiras quatro edições o título aparece como "O pós-moderno", tendo sido então alterado para "A condição pós-moderna".

E você ? Até onde a pós-modernidade evidencia-se em seu pensar, em seu agir, no mundo que o contém e na maneira com a qual nele se encontra ?

Tudo bem.Se tudo o que acima escrevi ainda continuar um pouco confuso o melhor é correr pra livraria, biblioteca, sebo, ou mesmo conseguir uma versão do livro em PDF e lê-la.

Fica a dica:

LYOTARD,Jean-Françoise.A condição pós-moderna.Rio de Janeiro:José Olympio Editora,2004.Trad.Ricardo Corrêa Barbosa.

Ah, nem vem me dizer que você não tem tempo.O livro é pequeno e a linguagem bem objetiva.No mais, não escravize-se à uma leitura.Saboreie as palavras.O conteúdo emocional no ato de ler é ingrediente fundamental na absorção do escrito.

Até a próxima !

sábado, 6 de março de 2010

Michael Jackson e as raízes do moonwalk



O mais famoso passo desenvolvido por Michael Jackson, o "moonwalk" não foi, na verdade, uma invensão sua.Elemento presente em diferentes formas de trabalho corporal extracotidiano, ele aparece na mímica - Barrault, Marcel -, no jazz, e até na pantomima chapliniana .

Abaixo exponho, respectivamente, vídeos extraídos do youtube que mostram, respectivamente, um encontro entre o mestre mímico francês e o ícone da música pop; e a aparição de tipos de "moonwalks" em diversos estilos de dança.






Revelar as influências de Michael afirma sua importância.Jackson com certeza tinha consciência de suas raízes e as usou de maneira muito particular.São pessoas como ele que democratizam a figura humana pela ampliação de suas possibilidades de movimento corporal que denotam a expansão de suas possibilidades de ação no mundo. Salve Jackson ! Let's keep rocking.


sexta-feira, 5 de março de 2010

Meyerhold: por um ator musical


"Eu trabalho dez vezes mais facilmente com um ator que ama a música. É preciso habituar os atores à música desde a escola. Todos ficam contentes quando se utiliza uma música "para a atmosfera", mas raros são os que compreendem que a música é o melhor organizador do tempo em um espetáculo. O jogo do ator é, para falar de maneira figurada, seu duelo com o tempo. E aqui, a música é sua melhor aliada. Ela pode não ser ouvida, mas deve se fazer sentir. Sonho com um espetáculo ensaiado sobre uma música e representado sem música. Sem ela, - e com ela: pois o espetáculo, seus ritmos serão organizados de acordo com suas leis e cada intérprete a carregará em si"


E.V.Meyerhold

quinta-feira, 4 de março de 2010

Lídia Christofoletti apresenta performance em Rio Preto



A performer Lídia Christofoletti apresentará sua video-performance "Mira tus pies" (vídeo acima) além de fotos da performance autobiográfica titulada "Pela cafonice de se dizer coisas das entranhas" na exposição "Olhar feminino", no Casarão da Cultura, em Rio Claro - SP, no próximo dia 07.A curadoria está a cargo de José Roberto Sechi.

Lídia Christofoletti é atriz e performer formada pela Universidade Estadual de Londrina onde cursou bacharelado em artes cênicas com habilitação em interpretação teatral.

Convite feito.Prestigiem.

Craig: um amante do símbolo



Imagine-se durante um ensaio de uma determinada peça escrita por um grande nome da literatura dramática.Agora, imagine que essa situação se passa entre o final do século XIX e o início do século XX em uma pequena cidade no interior da Europa.O diretor da peça, seu professor durante o periodo em que estudava na escola de interpretação está dirigindo uma dada cena da qual você participa.Ele lhe indica toda a marcação de cena, já no primeiro ensaio: dê três passos para frente, pare diante do público – não se esqueça de nunca dar as costas para o público – encare o público, levante sua mão direita até a altura do peito, tocando-o, e diga o texto do autor – não se esqueça de dizê-lo por completo e sem acrescentar ou tirar nenhuma palavra.
O sistema educacional das escolas de teatro dessa época baseava-se, grosso modo, na cópia de gestos e poses característicos de reconhecidos atores de então, que, por sua vez, eram reproduzidos pelos estudantes. Cabia ao professor demonstrar ao seu ator/aluno tais gestos e posições as quais ele, como aluno dedicado e fiel, deveria imitar.Durante o ensaio da peça de formatura, esse sistema educacional se manifestava na forma ilustrativa com a qual os ex-alunos, agora atores-copiadores formados, repetiam os gestos apreendidos na representação de alguma peça teatral famosa.Afinal de contas, isso tem um forte apelo comercial.
Numa outra ocasião semelhante, lá estava o diretor novamente demonstrando aos atores a maneira correta de se portar em palco.Montava-se a peça em uma ou duas semanas, apresentavam a encenação e corriam montar mais uma pra semana que vem pra faturar mais uma grana e não enjoar o público.
Não obstante, o enjôo veio. A decepção frente as condições nas quais os atores – e portanto o teatro – se encontravam naquela época, são manifestas, por exemplo, nas palavras de Eleonora Duse, que escreve em 1900 que:
Para salvar o teatro temos de destrui-lo; que todos os atores e atrizes morram de peste... Impossibilitam a arte.
O teatrólogo inglês Edward Gordon Craig (1872-1931), manifestou seu descontentamento em relação a qualidade dos atores de sua época, chegando a desconsiderar a possibilidade de uso do corpo humano como instrumento de criação artística.Decepcionado, ele usa a marionete para metaforizar a espécie de ator por ele almejada, um ator que não se deixasse perder em egoísmos doentios e emoções descontroladas, mas que conseguisse equilibrar sua emoção através de um cálculo matematicamente preciso.
Um dos fatores apontados por Craig como uma das razões da falência do teatro em sua época era justamente a falta de boas escolas para atores:
E vou lhes dizer porque o jovem ator embarca-se em falso enquanto se inicia no teatro.É porque antes disso não houve nem estudos nem aprendizagem.
Mas toda essa revolta contra o teatro de seu tempo vem também em grande parte, de um desprazer com a estética realista então predominante.Segundo Gordon:
Se há algo no mundo que aprecio mais que tudo é o símbolo (...) O realismo é um modo de expressão grosseiro, bom para os cegos.Opino que ninguém deveria buscar querela contra o simbolismo nem temêlo.
Craig desejava um teatro que manifestasse as tendências simbolistas emergentes da literatura e da pintura e não se limitasse a pretensão de ser uma fatia exata da vida como no naturalismo.Vale lembrar, que Craig trabalhou junto a Stanislávski na montagem de Hamlet (1911),tragédia de Shakespeare.A grande ironia é que três anos antes Craig escrevera que “representar Hamlet perfeitamente é, temo eu, impossível”.
Mas Craig (...) se você realmente acreditava na idéia de que montar Hamlet com perfeição seria impossível, porque então o fez?
Bem, por muitas razões: queria antes de tudo fortalecer-me em minha opinião (...) Estou mais convencido do que nunca de que as peças de Shakespeare são irrepresentáveis.
Bem, nestas condições, a montagem dificilmente teria sucesso. Já que Craig não acreditava na possibilidade de encenação dessa peça e queria, antes de tudo, fortalecer sua opinião (...) não demonstra um ar de abertura concorda?
Por outro lado, parceria entre Stanislavski e Craig pode advogar contra a ideia falsamente plantada pelos menos avisados, de que Stanislávski seria um defensor intrépido do naturalismo estrito. Além da experiência com Craig, Stanislávski admite sua influência simbolista em A ascenção de Hânele, de Hauptmann (1896), ao metamorfosear, de acordo com Jacó Guinsburg , mendigos, ladrões e prostitutas do mais baixo grau de degradação humana em figuras luminosas e angelicais.
O mesmo autor ainda aponta a influência simbolista do pai do “sistema” na montagem de O sino submerso, também de Hauptmann, revelando o gosto de Constantin pelo travestimento e pela máscara, pelo jogo lúdico.Na verdade, Stanislávski sempre se sentiu, ainda citando Guinsburg, igualmente seduzido pelo prosaísmo naturalista (...) e pelos vôos poético metafísicos do assim chamado “decadentismo” impressionista e simbolista.

Para se aprofundar:

CRAIG,Gordon.Del Arte Del Teatro.Buenos Aires:Liberia Hachette,1977.Tradução Nossa.
GUINSBURG,Jacó.Stanislávski e o teatro de arte de Moscou: do realismo externo ao tchekhovismo.São Paulo:Perspectiva,2006.2ª edição,1ª reimpressão.



terça-feira, 2 de março de 2010

Palavras sobre o treinamento técnico atoral


A importância concedida ao treinamento técnico para o ator é fio condutor a prolongar-se através do novecento (1) teatral - e ainda na contemporaneidade - afirmando presença desde Stanislavski até Eugenio Barba.Enquanto o mestre russo vai chamá-lo de "trabalho do ator sobre si mesmo", título de seu mais discutido trabalho teórico, Meyerhold preferirá biomecânica; Grotowski o chamará de treinamento - ou training - e Eugenio Barba, treinamento pré-expressivo e lhe conferirá a categoria de termo dicionarizado.

O treinamento atoral tem por finalidade o desenvolvimento técnico do ator num sentido que abrange tanto seu aspecto físico quanto mental.A separação denotada na frase precedente é meramente pedagógica já que neurobiologicamente falando ela é inexistente: não existe uma mente que não seja dotada de um corpo.Corpo e mente são duas instâncias de uma mesma substância que constitui o ser humano ator.

Ser humano ator.Nesse caso também nos deparamos com uma divisão impossível na medida que o ator é, antes de qualquer outra coisa, uma pessoa, e como tal, é reflexo e refletora cultural construto e construtora em constante mobilidade a re-elaborar-se interminavelmente através da vida.

Treinamento, treinamentos.Existem diversos.Cada qual caracteriza-se por uma espécie de personalidade cultural - podemos pensar num treinamento específico de uma determinada tradição teatral - e, na medida em que é assumido pelo ator em seu processo constante de construção de si, ele converte-se em treinamento pessoal, único, porque manifestação da singularidade do artista em construção.

Pensar em treinamento é pensar em vida: o trabalho do ator é sobre si mesmo.

(1) Termo empregado por Marco de Marinis para designar a era teatral compreendida entre a fundação do Théâtre-libre, por Antoine (1887) e a morte de Julian Beck em 1985 - que ao lado de sua esposa, Judith Malina, fundou o Living Theatre em 1947.

Para os que desejam se aprofundar:


ARTAUD, Antonin: O Teatro e Seu Duplo. São Paulo.Martins Fontes.3a Edição 2006.Trad.Teixeira Coelho.

ASLAN,Odette.O ator no século XX.evolução da técnica/problema da ética.Trad.Rachel Araújo de Baptista Fuser, Fausto Fuser e J.Guinsburg.São Paulo:Perspectiva, 2007.


BARBA,Eugenio & SAVAREZI, Nicola. A Arte Secreta do Ator: dicionário de Antropologia Teatral.Campinas:HUCITEC-UNICAMP,1995. Trad.Luís Otávio Burnier,Carlos Roberto Simioni, Ricardo Puccetti,Hitoshi Nomura,Márcia Strazzacappa,Walesca Silverberg e André Telles.

STANISLAVSKI,Constantin.El Trabajo del Actor Sobre Si Mismo.Buenos Aires:Ketzal,1983.Trad.Nossa.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Dividindo para somar

A fim de melhor organizar o conteúdo do blog decidi dividi-lo em dois.Sendo músico e ator é normal que assuntos musicais e teatrais aqui se misturem de maneira desorganizada.Organizar: foi para isso que decidi criar o www.casadaguitarra.blogspot.com .
Com este feito espero poder remeter minhas questões musicais para lá e limpar o espaço para postagens relacionadas de maneira mais focada em teatro e cinema.Todos os leitores estão da mesma forma convidados a visitarem a casa.Na verdade, como é característico da rede, não existem aqui espaços estanques encerrados por limites físicos, há, por assim dizer, um campo aberto em celebração móvel.
Pressinto que a partir daqui o blog vincular-se-á à minha pesquisa de conclusão de curso.Como meus leitores já sabem curso o quarto ano do curso de bacharelado em artes cênicas com habilitação em interpretação teatral na Universidade Estadual de Londrina.Talvez seja impossível - ao menos improvável - que uma pesquisa-vida não se converta num certo sentido em discurso literário diante deste sedutor veículo.O caminho é o passo: pensar o pensamento.
Sejam sempre benvindos amantes do teatro e da música.Compartilhemos !